segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

The Girl With The Dragon Tattoo

Título Original: The Girl With The Dragon Tattoo
Título Português: Millennium 1 - Os Homens Que Odeiam as Mulheres
Realizado por: David Fincher
Actores: Daniel Craig, Rooney Mara, Christopher Plummer, Stellan Skarsgård, Robin Wright, Joely Richardson, Yorick van Wageningen
Data: 2011
País de Origem: Estados Unidos/Suécia
Duração: 158 mins
M/16Q
Cor e Som












Algo tenebroso acompanha os filmes de David Fincher

Em 2009 uma adaptação cinematográfica sueca do livro “Män som hatar kvinnor” de Stieg Larsson, extremamente bem representada tendo as quantidades certas de obscuridade e perversidade, captou o mistério e a escuridão envoltas na obra literária. Apesar de algumas partes da história terem sido deixadas de parte.
As sequelas foram como que mal sucedidas, talvez pela redução do orçamento e troca do realizador dinamarquês Niels Arden Oplev, o que levou a não se ter conseguido capturar as emoções cruas do primeiro filme.
Um remake americano soaria sempre a algo despropositado, porque já se sabe como geralmente acabam estas tentativas, filmes vazios e com pretensões maiores que a capacidade dos realizadores. Mas David Fincher não é um realizador qualquer, e certamente nem com pretensões maiores do que a sua capacidade. Sublinho que não estamos perante um remake, mas antes uma verdadeira adaptação, pela qualidade demonstrada.
Não sei quantas vezes vi e revi os filmes de David Fincher, mas algo que impele, algo fascinante nos seus filmes que obriga, cativa e prende a que uma vez não baste, a que duas, três, quatro vezes nunca sejam o suficiente para finalmente arrumar a vontade. Seria interessante analisar a carreira de David Fincher, mas uma retrospectiva feita neste blog compila o que pretenderia dizer. Mas em traços muito curtos apenas para enquadrar o porquê de hoje David Fincher ser o que é, temos que perceber que estamos perante um realizador que manipula e brinca com as emoções de um filme de uma maneira obscura e doente, até por vezes perversa não só através do enredo inteligente mas também pelo ambiente tenebroso que nos agarra e não mais larga, pela fotografia e cinematografia.

O expoente máximo da sua excelência

The Girl With the Dragon Tattoo condensa tudo o que David Fincher fez até agora e mostra que, apesar de já existir uma excelente adaptação, conseguiu improvisar tornando este filme diferente e para uma melhor experiência cumpri a minha parte, li o livro, vendo de seguida a adaptação sueca.
Antes mesmo de começar, somos surpreendidos pela abertura que não deixa ninguém indiferente, talvez sem palavras e com uma cara de espanto de difícil explicação. Um dos mais brilhantes músicos da actualidade, Trent Reznor, pegou na “The Immigrant Song” dos Led Zeppelin, e com Karen O criou algo diferente. Uma abertura altamente estilizada e poderosa dando a entender o que viria aí, muito ao estilo de David Fincher. Talvez uma das melhores aberturas que se assistiu nos últimos tempos.
Desde o inicio podemos perceber que este é o mais obscuro e gráfico filme de David Fincher indo beber a toda a sua experiência incluindo a importância do diálogo, que já acontecia em Zodiac, mas ainda mais cativante. A imagem de marca de Fincher envolve toda a sala de cinema, que parece ainda mais escura do realmente é, à excepção de quando iluminada pela brilhante cinematografia da captura das paisagens nórdicas cobertas de neve.
Numa análise simplista a história prende-se com a descoberta e o desvendar dos mistérios do desaparecimento de uma rapariga por um jornalista interpretado por Daniel Craig. O jornalista Mikael Blomkvist é contratado para com a suposta desculpa de estar a escrever umas memórias sobre Henrik Vanger, interpretado por Christopher Plummer, investigar a família de Henrik e tentar desvendar o misterioso desaparecimento de Harriet que ocorreu 40 anos antes. Com a ajuda de uma perigosa mas brilhante investigadora punk, Lisbeth Salander, interpretada por Rooney Mara, mergulham num segredo perturbador e escuro de uma família ligada ao nazismo e à corrupção. O objectivo será o de demonstrar a violência dos homens para com as mulheres, sendo esta violência retratada várias vezes, mas muito mais a história trata.
Mais do que a história, o filme vive das suas personagens e na brutal qualidade de que os actores foram capazes de entregar à recriação das mesmas, seguindo a essência do livro.
Daniel Craig consegue aqui a sua melhor interpretação, provando que nele existe mais do que a personagem 007, mostrando um bem elaborado Mikael Blomkvist explorando o seu lado fraco e submisso mantendo sempre o charme característico das suas personagens.
Stellan Skarsgård desempenha com engenho o seu papel levando o espectador a deparar-se com a sua demência mesmo no final, surpreendendo. Christopher Plummer cumpre com o que nos tem habituado e destaque para Yorick van Wageningen que interpreta o sadico Nils Bjurman, para além da compreensão.
O grande e monumental aplauso, com todas as honras vai para Rooney Mara que interpreta uma personagem nunca antes vista em cinema, de uma forma devota que levaria muitas actrizes a recusar o papel. Para a interpretação de Lisbeth Salander, pegou na personagem do livro e transformou-se nela, alterou radicalmente a sua imagem e corporizou todos os sentimentos desta pessoa altamente violentada e vitimizada mas que se recusa a ser vista como tal. Lisbeth é a alma do filme, uma personagem das mais interessantes até hoje mas com uma difícil interpretação. Mara comanda todas as cenas numa mistura entre uma raiva efervescente contida e uma vulnerabilidade extrema e através dos seus olhos somos levados numa viagem entre as mais diversas emoções. Não menos importante foi a capacidade de aparecer completamente nua quando a cena o pedia mostrando uma incrível dedicação e realização da sua capacidade como actriz. A personagem precisava de alguém que fosse capaz de compreender as suas emoções ao mesmo tempo que lidava com um grande espectro de sentimentos. Como referi, Mara transformou-se na Lisbeth, e qualquer olhar transporta o peso e a excelência com que foi conseguido, sendo que por momentos podemos até questionar se não estaremos mesmo a olhar para a alma desta personagem, indo mais longe ao estar completamente nua nas cenas de violência sexual.
David Fincher criou cenas que não apelam a toda a plateia, sendo graficamente violentas materializando-se principalmente nas sequências entre Lisbeth e Bjurman, o seu tutor do estado, quando esta lhe pedia dinheiro. Não estamos à espera do que aí vem e quando nos apercebemos, Fincher mostrar tudo no seu máximo horror sem nunca cortar ou divagar, mostrando-se sensato levando as pessoas a agarrarem-se às suas cadeiras. O público tem que se consciencializar que este tipo e violência não existe apenas nos filmes, apesar do gáudio que sentimos quando Lisbeth consegue a sua “pequena” vingança, quase nenhuma a alcança.
Poderia fazer uma crítica só da personagem porque fiquei fascinado, deslumbrado, delirante, com a sua actuação e apesar de ser uma personagem estranha, Lisbeth é um génio naquilo que faz e existe sempre uma razão para as suas atitudes, toda e qualquer uma. A sua relação com Mikael é mais profunda de que no filme sueco e mostra o quão frágil Lisbeth se torna perante o jornalista que aceitou em ajudar. Mas o mistério da história torna-se cada vez mais envolvente enquanto se vai juntando as peças das suas investigações e percebemos com que tipo de família estamos a lidar, que tipo de pessoas realmente se escondem por de trás das aparências que Mikael e Lisbeth investigam.
Outro ponto de destaque vai para a brilhante e estrondosa banda sonora, de Trent Reznor e Atticus Ross. Neste filme conseguem explorar caminhos que não lhes foi possível no “Social Network”, levando o espectador a um estado de suspense constante em que qualquer coisa pode acontecer esperando apenas o momento certo para nos surpreender e espantar. Diria até que a banda sonora melhora as cenas, nunca se sobrepondo às mesmas.
A nível de fotografia, David Fincher supera todos os seus anteriores filmes, recriando a ambiência escura que a história transmite e a beleza da neve branca que pinta a paisagem sueca. Dos seus filmes anteriores podemos retirar a escuridão em que o filme se envolve tal como em 7even e Zodiac, parecendo que as nuvens nunca limpam o céu e um cinzento pinta a tela, envolvendo o filme num estranho e desconfortável cenário em que a acção se desenrola. É isso que cativa nos filmes de Fincher, esse ambiente misterioso e sombrio com que as personagens se relacionam e evoluem.
The Girl With the Dragon Tattoo é movido pelas personagens, e obviamente nenhuma supera Lisbeth, mas é um filme duro, obscuro e tenebroso que não agradará a toda a gente, mas muito superior a vários nomeados para a estatueta de ouro. Indo buscar a escuridão de 7even e Fight Club, o suspense de O Jogo e a qualidade do diálogo de Zodiac, estamos perante o êxtase da obra de Fincher, o seu melhor filme, a sua obra prima, a sua mona lisa em tons escuros. Brinca com os sentimentos do espectador como nunca antes tinha feito, levando a estados totalmente opostos de alegria, tristeza, raiva, medo, suspense. Para quem leu o livro vai achar que o filme é tudo o que desejou e mais, e que Rooney Mara é uma estrela em ascensão tendo aqui a melhor actuação do ano merecendo o Óscar de melhor actriz, visto os iluminados que se sentam nos seus tronos de ouro e analisam com base em interesses e falsas moralidades deixaram o melhor filme e obra prima de David Fincher de fora. Peço desculpa pela extensão da critica mas muito havia a dizer e acabo: "Conseguiste mais uma vez Fincher!"

Nota:

5 comentários:

Anónimo disse...

o retro está em força, assim gosto! excelente crítica pedro silva

Anónimo disse...

"...estamos perante o êxtase da obra de Fincher, o seu melhor filme, a sua obra prima, a sua mona lisa em tons escuros." Isto é a sério? Como pode alguém, mesmo um leigo no que diz respeito a cinema, classificar este filme desta forma? Comparar este filme a "Fight Club", "O estranho caso de Benjamim Button", "Se7en" ou até mesmo "Panic room" é sobremaneira anedótico. "The girl with the dragon tatoo" é o segundo pior filme de David Fincher (a seguir a "Zodiac"). A única coisa que se aproveita é Lisbeth Salander protagonizada por Rooney Mara e a abertura (aqui concordo que é genial) inicial do filme. É simplesmente mau. Nota-se a tentativa falhada de superar em larga escala (apenas supera pela qualidade da produção, mas também não vamos falar da diferença de orçamento) e da afirmação que os americanos conseguem fazer a mesma coisa que os suecos, mas melhor. Nem a história consegue sequer ser fiel ao livro. O que raio foi aquilo? Diálogos longos e monótonos, personagens sem graça e mentalmente entorpecedoras, banda sonora pobre... Enfim... Medíocre.

Anónimo disse...

ass: Ricardo Tomaz Alves

Pedro Silva disse...

Muito Obrigado Sr. Anónimo. A critica torna-se extensa, mas após várias leituras não consegui retirar muito mais texto. Estamos a tentar manter o retroprojecção vivo e agora nesta altura de Óscares vamos ter as restantes críticas aos filmes.

Pedro Silva disse...

Caro Ricardo Alves

Está a falar com alguém que conhece a fundo a obra de David Fincher. Talvez os leigos devam arder nas entranhas do inferno devido às tamanhas barbaridades que dizem....
Como você acha que este é o segundo pior, eu acho que por tudo o que foi dito é o melhor, apesar de continuar a preferir "7even" e "Fight Club". São estilos diferentes mas neste último apura ao máximo a sua arte, o seu engenho como realizador e a sua narração de uma história. Não me convence como eu não o convenço, é o magnifico disto tudo. E ainda bem que temos uma opinião forte, não acha? Percebe onde quero chegar?
Agradeço o seu comentário e por lêr o nosso blog.

PS - Cinemania está muito interessante também