sábado, 20 de outubro de 2007

Pisutoru Opera

Título Original: Pisutoru Opera
Título em Português: Pistol Opera
Realizado por: Seijun Suzuki
Actores: Makiko Esumi, Sayoko Yamaguchi, Hanae Kan, Masatoshi Nagase, Mikijiro Hira, Kirin Kiki, Kenji Sawada, Haruko Kato, Yoji Tanaka, Jan Woudstra
Data: 2001
País de Origem: Japão
Duração: 112 min.
M/16Q
Cor, Som








E que melhor forma de prestar um tributo a Branded to Kill - filme que já sabemos ser Anti-cinema por excelência, nos antípodas do cinema convencional - do que fazer uma pseudo-sequela situada num futuro próximo, onde assassinos com estilo ainda existem (ou melhor, ainda resistem)? Seijun Suzuki, depois de 10 anos sem tocar numa câmara, volta a sublinhar o delírio como forma de expressão, volta a dar uma força metafórica incomensurável aos cenários (como se o inanimado também falasse), enfim, tenta resgatar o sentido dessa obra antecedente, fabricando uma que resiste, por todos os meios, ao erro da repetição. Mas mesmo assim, porque é que este Pistol Opera não funciona tão bem como Branded to Kill? Não se pense nunca que a resposta a esta pergunta surge por haver uma repetição, ou um revivalismo de ideias e marcas. Embora existam referências discretas (seria melhor tributo e melhor filme se nem as tivesse...), jamais se reciclam aqui, a grande escala, blocos estilísticos, redundâncias formais etc. Poderíamos dizer que se não existisse em Pistol Opera nem o personagem imortalizado por Joe Shishido (que aqui surge obsoleto e confuso nas mãos do actor Mikijiro Hira) nem se não se cantasse a música de Koroshi no Rakuin a dada altura, este filme não seria de todo uma sequela, nem seria sequer semelhante, pesar-nos-ia, talvez na nossa avaliação, o facto de ser este um filme que na continuação da trilogia Taisho pretende ser inovador em tudo, isto é, recomeçar a criação partindo do nada para o todo.
Ora, voltemos à mesma questão de onde partímos: Porque é que Pistol Opera - mesmo com a auxese cénica e com os brilhantes meios que possuí (indiscutivelmente melhores do que à época Nikkatsu) - não nos convence tão bem, ou melhor, não nos remete para o espanto semelhante ao de Branded to Kill na altura do seu visionamento? Em primeiro lugar, temos de confessar que Suzuki não consegue completar, como seria previsto, o projecto. Não tem cuidado de o alicerçar numa base sólida e real. O filme começa tomando como ponto de partida um onirismo deslocado, uma (i)lógica narrativa que desemboca em jogos puramente formais e estéticos, sem qualquer conteúdo satírico ou de plena maldicência (como o filme de 1967 era caracterizado). Os personagens, estando prepositadamente deslocados, são joguetes na mão aleatória de Suzuki, prontos a serem a-psicológicos e a-sociológicos, confundindo o espectador em todos os ramos. Porém, este opúsculo sobre a desconexão, este tratado surrealista dos motivos cinemáticos primordiais (semelhante a um punhado de obras de David Lynch), até se dissolve bem na componente artística que este quer, no decorrer da obra, se converter. A barroquice das cenas finais é, por si só, uma representação do crescente metafórico da obra, que, simultaneamente é irreconciliável com o que se desenvolvera antes, essa espécie de narrativa entrecotada com intuições algo impercéptiveis. O cenário infernal que representa, em última estância o medo da morte (com inúmeras referências à Divina Comédia de Dante ou outras representações pictóricas da época) por parte dos gangsters - figuras que sempre nos habituaram a mostrar como indiferentes perante a morte - é pura simbólica da antítese desembocada num filme disperso, clara e obstinadamente vago e, sobretudo, criador de ambiguidade.
Pistol Opera, para alguns, pode ser o trajecto final de Seijun Suzuki, aquele no qual se reconciliam a sua cinéfilia plena. Pode mesmo ser o caminho último do cinema de experimentação. Cinema este que, agora divorciado de intelectualismos, apenas pretende ser "interessante da melhor maneira", prescrutando na forma e na estilística, um sentido para si próprio e não necessariamente para os outros. Tal como diria Suzuki - e para provar de vez as suas intenções -: "O cinema é, sobretudo, um dispositivo." Isto quer dizer um meio, algo que se faz não necessariamente tendo um fim...

Nota: 3/5

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