Salò o le 120 Giornate di Sodoma
Título Original: Salò o le 120 Giornate di Sodoma
Título em Português: Saló ou os 120 dias de Sodoma
Realizado por: Pier Paolo Pasolini
Actores:Paolo Bonacelli, Giorgio Cataldi, Umberto Paolo Quintavalle
Data: 1975
País de Origem: Itália/França
Duração: 112 min.
M/18Q
Cor, Som
Salò , última obra de Pier Paolo Pasolini, baseada no romance 120 dias de Sodoma do Marquês de Sade é a transposição da decadência da moral e da consciência em vícios sexuais depravados na Itália fascista de 1944. Tal como no romance de Sade, em Salò uma elite (nobre no romance, e fascista no filme) organiza um grupo de dezoito jovens (oito rapazes e oito raparigas) enclausorando-os num palácio fechado e assustador donde se prosseguirão orgias, torturas, vícios em nome do prazer decadentista Baudelairiano e deleite irracional e instintivo helénico dionisíaco.
Todo o filme é chocante: o mais dramático e o mais violento que tive prazer de presenciar, a sua crueldade e frieza no tratamento do ser humano provocam revolta ou nojo. Não fosse falar o filme da morte da moral e da consciência. Mas sobre este aspecto iremos referir adiante.
Pasolini cria, assim, um micro-mundo à la Sade com uma verticalidade de carácter Dantesco (veja-se a Divina Comédia e a Descida aos Infernos) no qual se divide o filme: Antinferno, Círculo das Manias, Círculo da Merda e Círculo do Sangue. Cada um tão simbólico como o outro, representando as relações complexas de poder e submissão existentes nas sociedades humanas, sejam elas fascistas ou democráticas. Na verdade, o fascismo italiano é uma metáfora gigantesca para a nossa era: a era do consumo, que transporta um poder que (citando Pasolini) "manipula os corpos de uma forma horrível, que não tem nada a invejar à manipulação exercida por Himmler ou Hitler." As elites governam o povo, abusando e explorando deles até à última gota de sangue. Portanto no que concerna ao sexo, às perversões e manias e ao sadomasoquismo, também elas são metáforas e alegorias. Veja-se que não é o sadomasoquismo em si que representa a intenção final de Salò, esta guarda-se no sentido real do sexo, que para Pasolini, é uma metáfora da relação entre poder e submissão. O sexo representa o que o poder pode fazer ao corpo humano. A redução do corpo humano ao estado de coisa, do tráfico do corpo, ou seja à anulação da personalidade de um em função da emanação de poder de outro.
Quanto ao poder, também o filme é bastante claro: diz o Duque para os seus amigos a determinada altura: "Nós, os fascistas, somos os verdadeiros anarquistas, isto é enquanto estivermos no Estado, porque na realidade, a verdadeira anarquia é a do poder." Um dos temas de Salò é a anarquia do poder, ou seja para Pasolini existe o poder em si, que deseja algo totalmente arbitrário, ditado exclusivamente por necessidades económicas que escapam à lógica ou à razão. Para sermos mais claros, há uma vontade de poder (como refere Nietzsche) em cada um dos seres humanos, e esta qualidade é íntrinseca e instintiva; logo anárquica. Pois o instinto não admite ordem, nem autoridade ou leis sem ser a suas próprias.
Assim podemos falar aquilo que Pier Paolo Pasolini declarava como estando omnipresente no filme, isto é a inexistência da História. Em Salò, os fascistas matam a divisão do pensamento ocidental - racionalismo e empirismo por um lado, e marxismo do outro - substituindo por novos valores alienantes e falsos: aqueles do deleite hedonista e da morte da consciência, resumindo da sociedade de consumo: o que irá conduzir ao que Marx considera como "um genocídio das culturas vivas, reais e precedentes." Por isso os círculos verticais dantescos existentes no filme justificam-se, finalizando-se no Círculo do Sangue, ou seja, no genocídio massificado da cultura humana.
Em Pasolini, o conformismo a tudo o que se disse é um índicio de morte e da anulação de personalidade, provocada pela sociedade - "que destrói a nossa natureza narcísica e rebelde" - metáfora utilizada em Salò na impotência, imponderabilidade e no conformismo dos jovens, que sendo brutalmente castigados, poucos reagem e muitos aceitam (inclusive a morte) os devaneios da elite. Acordando alguns do seu estado de anestesia para pontualmente serem obedientes e denunciarem os companheiros que não cumpriam as regras dadas pelos fascistas.
Salò o le 120 Giornate di Sodoma é um grito de desespero numa sociedade onde o homem não pode ser livre e não pode ter esperança quanto ao futuro enquanto não se rebelar e lutar por aquilo que lhe pertence face à negra e anónima elite hierárquica de presidentes e duques que passeiam e se divertem, desejando aprisionar no palácio cerrado a que chamamos de Mundo, o jovem povo que todos somos.
Quanto a esta denúncia, e para finalizar esta crítica, alguém disse sobre Salò : "Este filme é obrigatório, para todos aqueles que desejam alcançar o estatuto de cidadão."
Todo o filme é chocante: o mais dramático e o mais violento que tive prazer de presenciar, a sua crueldade e frieza no tratamento do ser humano provocam revolta ou nojo. Não fosse falar o filme da morte da moral e da consciência. Mas sobre este aspecto iremos referir adiante.
Pasolini cria, assim, um micro-mundo à la Sade com uma verticalidade de carácter Dantesco (veja-se a Divina Comédia e a Descida aos Infernos) no qual se divide o filme: Antinferno, Círculo das Manias, Círculo da Merda e Círculo do Sangue. Cada um tão simbólico como o outro, representando as relações complexas de poder e submissão existentes nas sociedades humanas, sejam elas fascistas ou democráticas. Na verdade, o fascismo italiano é uma metáfora gigantesca para a nossa era: a era do consumo, que transporta um poder que (citando Pasolini) "manipula os corpos de uma forma horrível, que não tem nada a invejar à manipulação exercida por Himmler ou Hitler." As elites governam o povo, abusando e explorando deles até à última gota de sangue. Portanto no que concerna ao sexo, às perversões e manias e ao sadomasoquismo, também elas são metáforas e alegorias. Veja-se que não é o sadomasoquismo em si que representa a intenção final de Salò, esta guarda-se no sentido real do sexo, que para Pasolini, é uma metáfora da relação entre poder e submissão. O sexo representa o que o poder pode fazer ao corpo humano. A redução do corpo humano ao estado de coisa, do tráfico do corpo, ou seja à anulação da personalidade de um em função da emanação de poder de outro.
Quanto ao poder, também o filme é bastante claro: diz o Duque para os seus amigos a determinada altura: "Nós, os fascistas, somos os verdadeiros anarquistas, isto é enquanto estivermos no Estado, porque na realidade, a verdadeira anarquia é a do poder." Um dos temas de Salò é a anarquia do poder, ou seja para Pasolini existe o poder em si, que deseja algo totalmente arbitrário, ditado exclusivamente por necessidades económicas que escapam à lógica ou à razão. Para sermos mais claros, há uma vontade de poder (como refere Nietzsche) em cada um dos seres humanos, e esta qualidade é íntrinseca e instintiva; logo anárquica. Pois o instinto não admite ordem, nem autoridade ou leis sem ser a suas próprias.
Assim podemos falar aquilo que Pier Paolo Pasolini declarava como estando omnipresente no filme, isto é a inexistência da História. Em Salò, os fascistas matam a divisão do pensamento ocidental - racionalismo e empirismo por um lado, e marxismo do outro - substituindo por novos valores alienantes e falsos: aqueles do deleite hedonista e da morte da consciência, resumindo da sociedade de consumo: o que irá conduzir ao que Marx considera como "um genocídio das culturas vivas, reais e precedentes." Por isso os círculos verticais dantescos existentes no filme justificam-se, finalizando-se no Círculo do Sangue, ou seja, no genocídio massificado da cultura humana.
Em Pasolini, o conformismo a tudo o que se disse é um índicio de morte e da anulação de personalidade, provocada pela sociedade - "que destrói a nossa natureza narcísica e rebelde" - metáfora utilizada em Salò na impotência, imponderabilidade e no conformismo dos jovens, que sendo brutalmente castigados, poucos reagem e muitos aceitam (inclusive a morte) os devaneios da elite. Acordando alguns do seu estado de anestesia para pontualmente serem obedientes e denunciarem os companheiros que não cumpriam as regras dadas pelos fascistas.
Salò o le 120 Giornate di Sodoma é um grito de desespero numa sociedade onde o homem não pode ser livre e não pode ter esperança quanto ao futuro enquanto não se rebelar e lutar por aquilo que lhe pertence face à negra e anónima elite hierárquica de presidentes e duques que passeiam e se divertem, desejando aprisionar no palácio cerrado a que chamamos de Mundo, o jovem povo que todos somos.
Quanto a esta denúncia, e para finalizar esta crítica, alguém disse sobre Salò : "Este filme é obrigatório, para todos aqueles que desejam alcançar o estatuto de cidadão."
Nota:

4 comentários:
Verdade, crua e dura
Dionisiaco?
Você não deve saber do que está falando meu caro.
Penso que sei, caro anónimo. Dionisíaco aparece, pela primeira vez, como uma qualidade estética muito particular (complementando-se e contrapondo-se com o apolíneo) no ensaio de 1872, O Nascimento da Tragédia de F. Nietzsche.
Aquilo que eu escrevi (já há mais de 4 anos) no texto sobre Salò foi uma mera consideração de dionisíaco como qualidade geral e abrangente de Dioniso (algo que não é, de forma nenhuma, o sentido dado por Nietzsche no seu ensaio), isto, é uma libertação pela carne, o sentido orgiástico da palavra que não foi tomado por mim como uma dádiva mas como uma prisão de exploração (é esse o sentido dado por Pasolini à sexualidade e a Sade).
Embora sendo oposta ao sentido Nietzscheano (pois ele não se restringe nem de perto nem de longe ao "Nascimento da Tragédia", sendo essa definição várias vezes re-vista e re-conceptualizada, por exemplo "Para Além do Bem e do Mal"; "Genealogia da Moral" etc.), falar de dionisíaco neste texto (se calhar ainda demasiado precoce e ainda com alguma pretensão de se abarcar tudo ao mesmo tempo, sem a capacidade devida para fazê-lo) foi apenas um significado mais geral daquele que é dado na teoria da estética.
Um abraço e da próxima vez, identifique-se. Responder para o vento, pode ser cansativo.
Crítica genial
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