quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

Branca de Neve

Título Original: Branca de Neve
Título em Português: Branca de Neve
Realizado por: João César Monteiro
Actores: Maria do Carmo Rôlo, Ana Brandão, Reginaldo da Cruz, Luís Miguel Cintra, Diogo Dória, Miguel Borges, Rita Durão, João César Monteiro
Data: 2000
País de Origem: Portugal
Duração: 75 min.
M/12
Cor, Som






O homem está deitado sobre a mulher e as suas atitudes parecem aos dois inocentes uma brutalidade espantosa. O amor será isto? Uma luta encarniçada? Ó noite, coberta pelo teu manto de lua: a neve, a neve ainda?
(João César Monteiro sobre Branca de Neve)

Já deviamos saber que a Arte quando se torna realmente numa força motriz, uma espécie de tratado radical e radicalizante de existência afirmativa, susceptibiliza, relampejando o movimento desorganizado da Opinião Colectiva (a Doxa Platónica) num horizonte onde todos os sujeitos tem algo para dizer, mesmo que seja para dizer coisa nenhuma. É necessário que face a monumentos artísticos, como este Branca de Neve, se tenha o cuidado do silêncio (como este tem o cuidado do negro), não vamos cair no erro de mergulhar nem no turbilhão do juízo fácil, que é feito na recusa total de admitir a ignorância, nem na verdade do Taxista (com todo o respeito pelo ofício referido, pois o estatuto de taxista é quase uma categoria ontológica que dispensa necessariamente conduzir um carro amarelo). Foi assim que em 2000 foi recebido Branca de Neve (e João César Monteiro), naquela confusão típica de empacotar autor e obra de arte: um filme que já não era cinema, e um realizador que era ladrão, ou então, causa de admiração; uma patifaria lusitana usurpadora à maneira de Alves dos Reis, o vento que levou o dinheiro que não tinha sido gasto, quiçá, por tentativa de rebeldia contra o Mundo e a Sociedade (palavras sempre bonitas num jardim). Hipóteses difíceis de considerar... Por isso, vamos acabar de vez com a polémica.
Esta crítica adiante tem a pretenção idiota - que não vai ser certamente cumprida - de fechar o significado de Branca de Neve, o ponto final da estética do cinema de César Monteiro (notar que o seu último filme, Vai E Vem, seria, neste fio de pensamento, a letra maiúscula que seguiria a redacção alargada até ao infinito, à inexistência de parágrafo). Um filme que surge não só por rebeldia ao sistema - como os simplistas da Comunicação Social proferiram -, mas, sobretudo, por necessidade, na senda do homem criador Nietzscheano que cria, dominado por uma força inexplicável: é imperativo que ele crie.
Nesta perspectiva, à película cinzenta surgem dois caminhos de leitura obrigatórios: a que respeita a forma, e outra que respeita a temática. A forma não é preciso enunciá-la mais, visto que foi esta, em rigor, que fez do filme aquilo que hoje se pensa, maioritariamente, que ele é. Uma brincadeira ofensiva para quem vê, recusando a imagem como o pathos de uma narrativa que "se ouve muito bem". Ora, a estética de Branca de Neve é, antes do mais, o resultado de um massoquismo neurótico de um autor que arranca a cabeça ao cinema , isto é, às raízes da arte dos jogos da Luz [Entenda-se a imagem projectada na tela como essencialmente luz]. Como se uma espécie de fotofobia (João César, ele mesmo, admite essa hipótese numa entrevista) o tivesse afectado, criando uma aversão visceral à iluminação. Porém, na tentativa de resgatar a luz (o divino, é disso que se trata sempre em JCM) "nesgas de céu" (suas próprias palavras) rasgam o escuro, iluminando por pequenos segundos a sala na qual a projecção ocorre. Aqui, finalmente encontramos algo que nos pode fundamentar a tese de que Branca de Neve é o anti-filme (mas é um filme, com certeza!), aquele que assume a impotência da imagem perante o efeito dramático. A fotografia do início do filme de Robert Walser estendido morto na neve, basta, ou melhor, é o pathos suficiente que se dizia inexistente. Todas as outras imagens que poderiam ter sido evocadas são supérfluas no limite de uma esquizofrenia genial que grita: "A partir daqui, não são mais possíveis as imagens!" Tais jogos conceptuais (o filme é afinal teoria sobre cinema), fazem-nos inclinar para a interpretação de Manoel de Oliveira que afirma ser Branca de Neve um filme sobre "as imagens das palavras". Sendo assim, não é nada mais do que um filme que decorre na escuridão pela defesa da poesia (as palavras matam a imagem, na medida em que são representadas na mente de cada um, como diria Oliveira) e a sala de cinema vai sendo esculpida tornando-se numa caverna, onde as vozes da fábula transvalorizada em baile de máscaras são ecos maximizados como quem berra para o fundo do abismo do nosso interior.
Neste passo, surge a questão temática, união espantosa da cinéfilia de César Monteiro e da dramatização pesada de Robert Walser. O filme é um diálogo tripartido entre os dois ilustres, pelo que João César inicia a pergunta com a fotografia, Walser, por sua vez, responde com a peça (recitada integralmente na escuridão) e César Monteiro finaliza o simpósio com uma pequena palavra, em jeito de síntese, percéptivel apenas no movimento dos seus lábios ("Não!" - é o que ele diz - e está mudo, porque alguém o calou...). Se Branca de Neve é anti-cinema, porque, como já explicámos, existe uma rejeição da imagem e uma sobrevalorização da palavra, nesta medida, o filme é também filme-poema. Não só porque o labor e a defesa da palavra, desembocada em imaginação ressoa a cada tirada certeira da peça de Walser, mas também porque a peça, toda ela é a dilaceração alegórica de dois mundos, sendo que um deles jamais será possível de regressar. O mundo da fábula, que não é mais do que a infância perdida. Em Walser, tudo são máscaras da impossibilidade de redenção do adulto que vê no seguimento do conto dos Irmãos Grimm, uma verdade: a desilusão da ilusão. O ódio e o amor que, citando outra vez Manoel de Oliveira, são as faces da mesma moeda, o desespero de Branca de Neve em reencontrar outra vez os anões num mundo de sonho alargado na impossibilidade de os voltar a ver e no desespero da sua existência agora presa na maturidade, em jogos carnais com a Rainha, o Príncipe e o Caçador. Presa numa sensualidade em todo idêntica ao erotismo da trilogia de Deus, a personagem de Branca de Neve quer a sua primeira inocência, mas apenas deseja no vazio, crescendo, aproximando-se, cada vez mais, da morte. É impossível a infância, e por isso também como luto, não existe luz, não é mais possível a imagem. Aqui a resposta de Walser à sua própria morte fotografada no início do filme, anunciada por João César. Porém, no final do baile de máscaras - metáfora compreendida como o Ser social, a morte simbólica da criança - insurge-se a negação pessoal do verdadeiro autor do filme, o "Não" definitivo. Sobre isto o mesmo disse: "A Branca de Neve aceita tudo, eu não!"
É um erro sequer ponderar a não existência de efeito cénico em Branca de Neve ou que se trata aqui de uma mera adaptação linear da obra, senão qual seria a razão de no final, voltarmos a ver imagens? Qual seria a razão das "nesgas de céu", interrompendo o pessimismo de um drama, acima de tudo, humano? Urgia a necessidade de responder a Walser, e é isso que João César faz: silenciado pela frieza do bafo das linhas e entrelinhas cegas de Schneewittchen, ele ainda tem o direito de usar a imagem. E o seu "Não" não é ouvido, como se só ouviu até aí, mas é visto e reconhecido como tal, e neste sentido, podemos finalmente concluir de forma madura ser Branca de Neve não só um drama sobre as imagens das palavras, mas sobretudo, um meta-filme trágico sobre a palavra inexistente na imagem muda. Depois de vivido o crepúsculo, a hipótese do regresso da neve (neve; neve ainda?) é recusada por dignidade. A esperança, diz César, reside na recusa da candura ilusória de quem espera regressar sempre ao paraíso perdido. Isto é, Branca de Neve, paralela a Susana de Buñuel, que diz sempre "Sim" à catástrofe, até ao declínio.

5 comentários:

Anónimo disse...

Salve, JCM!!
Um génio incompreendido!

"Queriam telenovela, era?!?"
:)

abraço!

Anónimo disse...

Ridículo!
Ridiculo um tipo que ganha um concurso para fazer uma longa metragem com dinheiro público e devido a uma crise de inspiração faz um filme sem imagem!!! (não, não foi de proposito! e não, ele nao tinha pensado nisso assim! e não, não significa o que posteriormente disseram e disse esse senhor! se o projecto fosse esse nao teria sido aprovado... por muito corrupto que fosse o juri!)
Ridiculo ainda esta dicertação que tem em vista defende-lo! quando se tenta ser um intelectual e não se consegue, é-se um PSEUDO-INTELECTUAL.... neste caso cego! não sou contra o chamado cinema de autor! sou contra a falta de inteligencia das pessoas que o defendem cegamente! e que tentam passar atestados de estupidez e ignorancia a pessoas com opinioes diferentes...

é simplesmente lamentavel!

Anónimo disse...

ridícula e estúpida é a tua opinião, és mais um com o intestino grosso ligado a hollywood...

césar simplesmente o mestre

Anónimo disse...

ridícula e estupida e pior ainda - ignorante é a tua opinião, não é de esperar para quem tem o intestino grosso ligado a hollywood

césar simplesmente o mestre.

Anónimo disse...

Estupido e ignorante comentário...

PORTUGAL UM PAÍS PEQUENO DEMAIS PARA JOÃO CÉSAR MONTEIRO

É triste em Portugal ainda não se aperceberem de tamanho génio, mas virá o dia...