sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

Jisatsu Saakuru

Título Original: Jisatsu Saakuru
Título em Português: Suicide Circle
Realizado por: Sion Sono
Actores: Ryo Ishibashi, Akaji Maro, Masatoshi Nagase, Saya Hagiwara, Hideo Sako, Yoko Kamon, Rolly, Takashi Nomura
Data: 2002
País de Origem: Japão
Duração: 99 min.
M/18
Cor, Som









Quando Suicide Circle chegou às salas no Japão levantou uma enorme polémica - uma celeuma tão grande ou maior do que a já provocada por Battle Royale dois anos antes. Mas que tem estes dois filmes em comum? Sim, tanto num caso como no outro a juventude está encarcerada num mundo bizarro que a faz desumanizar, aceitando a morte como paisagem do seu quotidiano, mas o que é de maior importância é que ambos deitam esse esgar maldito, antecipador das mais graves catástrofes sociais. Quer queiramos, quer não, quando se fala neste tipo de títulos estamos sempre a tratar filmes que, apesar de usarem o factor "extremo" como agitador de audiências de olhos bem fechados, são também tratados sociais consciencializantes, tendo em conta que as manifestações hiperbólicas da narrativa e dos visuais arrojados (um gore sui-generis a cair para o "trash", diga-se) são apenas o prenúncio hipotético do tempo presente: "se as coisas continuarem assim, então talvez isto possa suceder..."
O problema de Suicide Club (e começamos pelos problemas!) é que esse discurso de dimensão sociológica se vai esgotando, a pouco e pouco, numa história que não pretende comovere, nem, em última instância, unir o público pela tragédia ou pelo choque (factores universalizantes à natureza humana, que nos aproximam apesar das singularidades, como sabemos). É antes disso, uma sátira visceral ao Egoísmo de uma sociedade à beira da decadência. Um prenúncio pós-moderno que, na senda do já referido Battle Royale, se apega à juventude como objecto de estudo (e haverá melhor faixa etária para rebentar o caos, naquela lógica do cuidado com as gerações vindouras?) Ao arrancar uma temática vinda dos piores pesadelos (uma onda de suicídios imparável, sem justificação, acabou de chegar a Tokyo), Suicide Circle rebusca aquela radicalidade pós-nouvelle vague dos anos 80, sublinhando que hoje ainda se pode fazer cinema com uma premissa ambiciosa e de uma coragem latente que se deve sublinhar. Neste ponto, a sátira pela sátira vai divergindo dos seus intentos originários e recria-se noutros géneros (poder-se-ia dizer que Suicide Club é, em certos momentos, thriller e policial - quando a invistigação dos detectives arranca). O equilíbrio é razoavelmente considerado. Cada cena se vai recriando de modo tal, que não existe surpreendentemente, uma incoerência formal, onde, por exemplo, a ultra-violência dava lugar, no seu seguimento, a clichés policiais.
As cenas falam por si. Ora apoiado numa brutalidade estética que faz gracejar pelo seu extremismo, ora lapidado num absurdo da narrativa, em que ela própria cria os seus próprios becos-sem-saida (muita coisa aqui não é para ser percebida, ponto final.) o filme niilista de Sono Sion é aquilo que é: ambíguo no seu cerne. Se todos os indícios apontavam, então, para um estudo sociológico, no domínio da especulação, dos efeitos da caótica sociedade japonesa (o híbrido da cultura e da canção "pop" e o estilismo trash gritam numa fusão espantosa) onde, sem causas conscientes, se perde o sentido da vida material, se reduz toda esta complexidade a uma alienação colectiva estonteante e doentia pela antítese da totalidade, o que parece estar por detrás é algo ainda mais essencial. A ressaca da modernidade, a experiência arruinada mostra que o problema principal é o egoismo. Sono Sion aponta a sua objectiva ensaguentada no problema das relações humanas num sentido muito pós-moderno de filmar/ filosofar: vivemos porque somos egoistas, e a pessoa humana é esse monstro que se esconde nas instituições (a família, o trabalho, em suma, a esperança no futuro) de modo a não sofrer. Mas o anónimo organizador do clube suicida revela a verdade, em forma de questão (e é esta adivinha sem resposta que causa o desespero): "Estás conectado contigo mesmo?"
No seu mais aperfeiçoado Noriko's Dinner Table (uma espécie de sequela a esta barbaridade) alguém dizia: "O clube do Suicídio é o mundo lá fora." Talvez isto explique muito o problema da identidade (trilhada quase da mesma forma ao longo da filmografia de um Kiyoshi Kurosawa ou de um Shinji Aoyama) num mundo despersonalizado, sem essência. Sono Sion aqui, ainda vai gozando com coisas sérias. Também esse imperativo (o niilismo do desesperado que cria no vazio) algo muito de suicidário. Sinais dos tempos, sinais dos tempos.

Nota:3/5

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