sábado, 17 de março de 2007

Dead or Alive 2: Tôbôsha

Título Original: Dead or Alive 2: Tôbôsha
Título em Português: Dead or Alive 2: Birds
Realizado por: Takashi Miike
Actores: Sho Aikawa, Riki Takeuchi, Shinya Tsukamoto, Kenichi Endo, Noriko Aota, Yuichi Minato, Ren Osugi
Data: 2000
País de Origem: Japão
Duração: 97 min.
M/16Q
Cor, Som









Algo que sempre nos provou Takashi Miike é a sua competência para construir algo novo, algo que quebre todas as convenções de como se faz um filme. Na verdade, para Takashi Miike o que conta sempre é a experiência de fazer algo original e espontâneo. Provou-nos esta filosofia, tanto num Ôdishon (Audition) - executando um cruzamento entre episódios do quotidiano e terror em estado puro -, ou num Katakuri-ke no Kôfuku (Happiness of the Katakuris), sendo que o género deste filme é inclassificável devido à sua metamorfose musical/gore/familiar, ou ainda como num Koroshiya 1 (Ichi the Killer) e a sua depravação violenta extremada.
Ora, quando lhe é proposto fazer uma sequela do infame Dead or Alive: Hanzaisha, Miike aproveitou para resistir à tentação, e executa uma sequela que não é sequela. Facto é que, do original, este Dead or Alive 2: Tôbôsha só herdou o nome e os actores principais como protagonistas. A história e mesmo todo o estilo mudam de uma forma drástica, e até confusa, pois, questionamo-nos como é que, em tão pouco tempo, Takashi muda violência chocante, estilo Manga para uma meditação poética sobre a perda da inocência. Na verdade, como diz Sloan Freer, este Tôbôsha é um alien tendo em conta não só a prequela que seria suposto seguir, mas também toda a cinematografia do realizador, filósofo do punk-rock. Embora a sua cinematografia seja vastissíma (em 17 anos de carreira, já realizou o invejoso record de 70 filmes), só podemos apontar um único filme em que o estilo poético se sobrepõe num criador que custuma ser bélico, experimental, em suma, anti-poético: Chûgoku no Chôjin (The Bird People in China), de 1998. Verdade é que, por detrás deste grande realizador, está um artista que formolou o argumento destas duas pérolas, Masa Nakamura, portanto, se queremos culpar alguém, do facto de Dead or Alive 2: Tôbosha ser um piscar de olhos aos filmes de Kitano (e isso implica mudanças muito profundas para os habitués da violência brutalizada de Miike), é ele que temos de apontar o dedo.
De facto, se Hanzaisha, o predecessor, era niilista e usava o surrealismo para levar o espectador a um estado de desespero ou alucinação dadaísta, Tôbôsha, não se contenta já com a inglória especulação do que é um filme de acção, e avança para um género mais humano - que como já se disse se assemelha a Sonatine ou 3-4x Juugatsu -, usando o factor surrealismo para a lapidação poética ou metafórica da narrativa e das personagens. Assim, transformando um filme de yakuzas num conto sobre a ressureição, Miike procura encontrar a razão pela qual dois amigos de infância, agora assassinos impiedosos continuam a existir. Tentando a todo o custo, procurar respostas, os dois amigos revivem os tempos de infância no orfanato de um ilha remota, que antes os acolhera e tornam-se em anjos justiceiros. O seu objectivo é proteger uma inocência da infantilidade - inocência essa, que eles mesmos perderam no mundo do sangue e da morte. O duo renasce do desespero, e literalmente na tela, surgem asas nas suas costas como metáfora para o combate por uma causa nobre. Os assassínos por encomenda mutam-se, assim, em purificadores da sociedade, matando chefes de mafia, para angariar fundos, salvando assim milhares de crianças do Terceiro Mundo. No entanto, a moral tradicional prevalece, e a culpa do mal praticado, está simbolizado na perda de saúde de um dos "anjos".
Assim, o desfecho fatalista aparece como uma conclusão dos mártires da sociedade criminal. Não há fuga possível, pois a violência só gera mais violência, e os dois "anjos da guarda", morrem partilhando entre eles a sua pureza mais visível, alegoricamente demonstrada na refeição da sopa.
Todavia, os defensores da juvenilidade e da inocência, não podem guardar para sempre este diamante de virtude. Tudo será corrompido por uma sociedade adulta, e isso é só uma questão de tempo e crescimento. Veja-se a cena do teatro "para maiores de 18", que é observado por inúmeras crianças. A perda da inocência é, porventura, o mais belo e conseguido tema nesta viagem surreal pela procura de identidade, e quanto a este aspecto, recorde-se, o confronto final e a metamorfose surreal dos três assassinos inimigos; numa certa altura, eles transformam-se em crianças, sugerindo assim, que até mesmo os mais monstruosos assassinos, foram em tempos inocentes e puros.
Dead or Alive 2: Tôbôsha encerra com o nascimento de uma nova vida. Uma nova criança, uma nova esperança, esta última palavra, curiosamente, também posicionada prepositadamente no maço de cigarros na cena cómica com Shinya Tsukamoto. Em suma, é por ser um filme diferente, que Tôbôsha se afigura tão bom (ou melhor) como a primeira instalação.

Nota:

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