segunda-feira, 2 de abril de 2007

Nihon Kuroshakai

Título Original: Nihon Kuroshakai
Título em Português: Ley Lines
Realizado por: Takashi Miike
Actores: Michisuke Kashiwaya, Yukie Itou, Kazuki Kitamura, Tomorowo Taguchi, Sho Aikawa, Samuel Pop Aning, Ren Osugi, Dan Li, Ryuushi Mizukami, Hua Rong Weng, Kôji Tsukamoto
Data: 1999
País de Origem: Japão
Duração: 105 min.
M/16Q
Cor, Som







Nihon Kuroshakai - terceiro e último capítulo da trilogia Kuroshakai (Sociedade Negra) - é quintessencialmente o expoente máximo da obra de Takashi Miike. É nela que se convergem (quase) todos os pontos; não só os que concernem especificamente a trilogia Kuroshakai, como também os que dizem respeito à sua cinematografia total. Assim, é nos difícil classificar ou clarificar o estilo que se usa aqui:pois, se por um lado, é extremamente complicado apelidarmos esta pérola de filme de acção (como seria Shinjuku Kuroshakai, primeira instalação da trilogia) , também não nos é salutar, referirmo-nos a ela só como uma elegia da despoetização do real (como foi Gokudô Kuroshakai, segunda página em branco da trilogia). Na verdade, este nosso Ley Lines reflecte em si mesmo, uma mistura inclassificável de géneros. Pega no conflito da perda de identidade (ponto em comum dos dois outros filmes) e extende-o ora, umas vezes, para o lado da violência brutal e brutalizante, ora outras, para o canto da nostalgia, do sofrimento interior e de um constante reinventar de artifícios imagéticos. Posto isto, podemos dizer que - tal como afirma Tom Mes na sua crítica - Ley Lines não vive só de um final memorável à semelhança de Ôdishon (Audition) ou Dead or Alive: Hanzaisha, ele mantêm-se do princípio ao fim, como um filme originalíssimo, inteligente e chocante quer pela sua violência e temas à la Miike, quer pela sua beleza inconformável, resumo de todos os aspectos anteriores.
Mais análogo a Shinjuku Kuroshakai (Shinjuku Triad Society) do que a Gokudô Kuroshakai (Rainy Dog) - este último invertendo os locais da premissa - , também aqui os protagonistas são três rapazes - um deles Tomorowo Taguchi que na trilogia interira ocupa o lugar de alter-ego da personagem principal - descendestes de chineses, residindo numa pequena e pacata aldeia rural japonesa. Logo numa cena inicial - magicamente filmada, adicionando ao estaticismo kitanesco, uma coloração viva à Tsukamoto de Tokyo Fist - o espectador obtêm a noção da forma como estes rapazes são tratados. Não sendo japoneses de sangue, há ao longo de toda a película, um sentimento de marginalização e exclusão social. Á semelhança do Detective Kirya de Shinjuku Triad Society e de Yuuji de Rainy Dog, os rapazes fogem do campo - fazendo quase que uma premonição e mitificação do êxodo rural - para escaparem às suas origens, escondendo assim a sua própria identidade, querendo recomeçar de novo numa megalópole gigante que, à partida, oferece as opurtunidades desejadas. Todavia, estes jovens não sabem que o quarteirão de Shinjuku só os vai fazerem perder-se mais. Lá só existe deboche, drogas, violência, e rapidamente aqueles rapazes entregam-se à vida daquele mundo negro. Fazendo assim com que, a ambiguidade lhes ocupe a mente, e a esperança se evada dos seus corações.
Todo este ambiente está magistralmente bem concebido, a coloração dos cenários e as motivações cénicas são únicas, sendo o único filme parecido em termos desta perfeita aproveitação dos recursos, Tokyo Fist, como já se teve a opurtunidade de referir. Porém, à medida que os rapazes tentam executar um último plano para escapar para o Brasil (esse último Éden também clamado em I Live in Fear de Kurosawa), envolvem-se, assim, com um chefe da máfia chinesa, Wong, que os quer, num ápice, todos mortos.
Evocando Koroshiya 1 (Ichi the killer) para os aspectos da depravação e decadência humana (cena aterradora da violação entre outras) e Dead or Alive 2: Tôbosha para os pormenores metafóricos da condição humana (o final melancólico, mas jamais melodramático) têm-se, no final das contas, uma obra fantasmagórica na sua totalidade.
Como refere Miike numa entrevista sua: "desde o princípio do filme que o espectador sabe o desfecho." Ora, só se prova mais uma vez que na arte do cinema o que importa realmente não são reviravoltas inesperadas e épicas narrativas, mas sim aquela sinceridade da última cena, onde os dois amantes navegam num barco - que vai afogando com o sangue de ambos - pelo oceano desértico, cantando uma música sobre sonhos. E é precisamente no mundo dos sonhos que todos os protagonistas permanecem, nessa sua infantilidade nunca vivida. A morte, digamos, é um alívio para os marginalizados que nem gangsters sem podem tornar.
Em resumo, uma obra única, que representa o final da triologia Kuroshakai e o início da trilogia epígona Dead or Alive, esta, de uma maneira geral, mais centrada na estética do que na humanização.

Nota: 3/5

Sem comentários: