quinta-feira, 14 de junho de 2007

Tong Nien Wang Shi

Título Original: Tong Nien Wang Shi
Título em Português: A Time to live, a time to die
Realizado por: Hou Hsiao-Hsien
Actores: Mei-Feng, Tang Yu-Yuen, Tien Feng, Xin Shufen, Yiu Ann-Shuin
Data: 1985
País de Orígem: Taiwan
Duração: 138 min.
M/12Q
Cor, Som









Como constatou o comissário Augusto M. Seabra, aquando de uma retrospectiva de Hou Hsiao-Hsien na Culturgeist, parece que haviam três filmes essenciais no corpo artístico deste realizador difícil de Taiwan: este aqui criticado Tong Nien Wang Shi (título por si só bastante sugestivo: A time to live, a time to die), o extraordinário Hsimeng Jensheng (The Puppetmaster) - que iria ser plebiscitado e vencedor em Cannes no ano de 1993 - e o Hai Shang Hua (Flowers of Shangai) - obra mais tardia, mas não menos interessante.
O que é preciso saber desta consideração é que, de facto, A time to live, a time do die é o primeiro grande passo de Hou Hsiao-Hsien como realizador. Aqui ele afirma-se, finalmente, como espectador dos destinos das filmagens (nunca sendo um interveniente digno desse nome), e desenvolve uma história em torno da qual se centram as suas memórias de infância - continuando, desta maneira, a sua trilogia (prefiro dizer quadrologia) das memórias individuais - todavia, ao contrário do que se poderia pensar, este filme não está, totalmente, na senda dos seus anteriores, que falavam de uma individualidade restrictiva, de contos morais, em última estância, fabulados com o real. Aqui, a camâra é seca, não é de emoções facéis, demonstra-se, acima de tudo, fria e distante do espectador (vejam-se os planos típicos de Hou, a câmara que se situa entre portas, ou entre janelas, realçando esse sentido voyeur, e por isso mesmo, distante, que aqui encontram a sua liberdade maior). Esta rigidez na arte de filmar é pactuada com espaços interiores claustrofóbicos, em consonância com uma maior extensão dos exteriores (onde as crianças brincam, onde a vida social decorre).
A história - semi-autobiográfica do próprio realizador - narra a vida e as transformações de uma família que é obrigada a permanecer em Taiwan, fugindo de uma China recém comunista opressora. É num contexto novo - e num novo país também - que esta família - talvez paradigma de tantas outras - se tenta acustumar a uma nova vida. Porém, o desejo de voltar à terra-natal - é sempre proferido na figura de uma avó enternecedora, ilustrando também a desconexão com um mundo tradicional inatingível. As personagens que sonham no vazio são sempre alvo deste realizador que, como já se disse, é inclusive mais espectador do que nós.
A família - tal como o título do próprio filme sugere - vai conhecer o seu tempo para viver e o seu tempo para morrer, o tempo para se acustumar às regras de uma nova sociedade, e o tempo para perecer, deixando o sonho de voltar para a China como uma mera impossibilidade, vagabundeando pelo esquecimento da rotina do quotidiano. O rapaz - que é Hou Hsiao Hsien -, herói da história, vai vendo, a pouco e pouco, a antiga geração desaparecendo à medida que cresce: o seu pai (cuja morte é tranquila e é filmada com uma serenidade a toda a prova) simbolizando a autoridade, a sua mãe (cuja morte é dolorosa) e a sua avó terna(que morre, justamente, no final, de forma desprezível e vil, fechando um círculo de vivências geracionais, encerrando um passado genealógico que foge aos anais de uma História geral, que, pelo contrário, permanece do forro individual).
"Um tempo para viver, um tempo para morrer", se fosse realizado por Yasujiro Ozu, poder-se-ia chamar, também, Histórias de Taiwan. A maneira como o tempo e as relações humanas, os afectos, se criam e se destroem, a fugacidade da vida e do tempo que escapa sem tomarmos conta, tudo isto, aliado ainda a uma serenidade quase comparável à filosofia bûdica, neste canto rural, Hou Hsiao-Hsien faz-nos reflectir da maneira mais dura possível, e por isso, pode, sem a sua intenção, fazer-nos chorar devido a essa violenta austeridade, a esse cinema bruto, mas, ao mesmo tempo subtil e sagrado, sereno e leve.

Nota: 5/5

2 comentários:

Anónimo disse...

cheira me que este blog ta a perder a exigencia

Miguel P. disse...

De todo. As nossas avaliações são, desde o ínicio, ponderadas, comparativas e exigentes. Se teve o azar de "cheirar" uma página em que, realmente, as notas sejam todas mais altas (o Pianista, Aurora e este A time to live, a time to die)é porque foi uma alegre coincidência. Continue a visitar-nos e verá justiça a ser feita.

Muito obrigado